Já vai acalorada a campanha presidencial com uma disputa
aberta entre Dilma Rousseff, atual Presidenta e a pretendente Marina
Silva. Trata-se, na verdade, do confronto de dois projetos: a manutenção
por parte do PT de um projeto progressista, marcado por fortes
políticas públicas que permitiram integrar uma Argentina inteira na
sociedade organizada. A prática política, imposta pelas elites, era de
os governos fazerem políticas ricas para os ricos e pobres para os
pobres. Mas aconteceu uma viragem em nossa história. Alguém do povo
chegou ao centro do poder e conferiu outra direção ao Estado. Não se
pode negar que o Brasil numa perspectiva geral, especialmente na ótica
dos pobres, melhorou muito. Negá-lo é mentir à realidade.
A este projeto progressista se opõe o que a candidata Marina chama de
“nova política”. Quando observada de perto, porém, não passa de um
projeto conservador e velho que beneficia os já beneficiados e que
alinha o país à macroeconomia voraz que faz com que 1% dos americanos
possua o equivalente ao que juntos 99% da população ganha. Esse projeto
visa a conter o processo progressista, evidentemente, sem anulá-lo,
porque haveria, sem dúvidas, uma rebelião popular.
As opções do PSB e de Marina Silva representam um retrocesso do que
havíamos ganho em 12 anos. A centralidade não será o Estado republicano
que coloca a “coisa (res) pública” em primeiro plano, o estado
dinamizador de mudanças que beneficiam as grandes maiorias a ponto de
ter em 12 anos diminuído a desigualdade social em 17%. Agora com Marina,
o foco é o Estado menor para conceder maior espaço ao mercado, ao livre
fluxo de capitais sem lei, reafirmando as teses neoliberais: o aumento
do superavit primário, que se faz com corte dos gastos públicos, com
arrocho salarial e desemprego para assim controlar a inflação e
finalmente impondo a autonomia do Banco Central. Especialmente este
último ponto é grave porque um presidente foi eleito também para
gerenciar a economia (que é parte da política e não da estatística) e
não entregá-la às pressões dos capitais, dos bancos e dos rentistas.
Seria um atentado à soberania monetária do país.
Este projeto velho, foi aplicado no Brasil pelo governo do PSDB, não
deu certo, quebrou a economia da União Européia e lançou o mundo numa
crise da qual ninguém sabe como sair. O efeito imediato será, como
referimos, o arrocho salarial e o desemprego com o repasse de grandes
lucros para os donos do capital financeiro e dos bancos.
Marina quer governar com os melhores da sociedade e dos partidos, por
cima das alianças inevitáveis no nosso presidencialismo de coalização.
As alianças se farão, provavelmente, com o PSDB e com o PMDB e terá
assim que engolir José Sarney, Renan Calheiros e Fernando Collor que ela
tanto abomina. Sem alianças, Marina corre o risco de não ver passar no
parlamento, os projetos que propõe, por falta de base de sustentação.
Quem a escuta e lê seu programa parece que fez um passeio pelo Jardim
do Eden: tudo é harmonioso, todos são cooperativos e não há conflitos
por choques de interesses. Esquece que vivemos num tipo de sociedade de
mercado (e não apenas com mercado) que se caracteriza pela competição
feroz e por parca cooperação. Estimo que Marina, religiosa como é, se
inspira no sonho do paleo-cristianismo dos Atos dos Apóstolos onde se
diz que “a multidão era um só coração e uma só alma;ninguém considerava
sua a propriedade que possuía; tudo entre eles era comum”(At 4,32).
Estas opções mostram claramente que ela mudou de lado. Antes quando
estava no PT do qual é uma das fundadoras falava-se na opção pelos
pobres, por sua libertação e se denunciavam os faraós de hoje. Construía
no canteiro dos explorados e injustiçados. Agora ela constroi no
canteiro dos seus opressores: os endinheirados, os bancos, o capital
financeiro e especulativo. Leva a eles o tijolo, o cimento e a água.
Seus assessores na economia são todo neoliberais. Os seringueiros do
Acre rechaçarem o fato de Marina colocar entre as elites a figura de
Chico Mendes, pois sabem que foram agentes dessas elites que o
assassinaram; por isso, protestaram veementemente e reafirmaram a
tradição do PT apoiando a candidata Dilma.
Minha suspeita é de que Marina persegue o poder e visa a alcançar a
presidência, por um projeto pessoal, custe o que custar. Diz-se por ai,
que uma profetiza de sua igreja evangélica, a Assembléia de Deus,
profetizou que ela, Marina, seria presidenta. E ela crê cegamente nisso
como crê no que, diariamente lê na Bíblia, passagens abertas ao acaso,
como se aí se revelasse a vontade de Deus para aquele dia. São as
patologias de um tipo de compreensão fundamentalista da Bíblia que
substitui a inteligência humana e a busca coletiva dos melhores caminhos
para o país.
Sou duro na crítica? Sou. E o sou para alertar os eleitores/as sobre a
responsabilidade de eleger uma presidente com tais ideias. Já erramos
duas vezes, com Jânio e com Collor. Não nos é mais permitido errar agora
em que a humanidade passa por uma grave crise global, social e
ambiental e que reverbera em nosso país.
Não devemos desistir do que deu certo e avançou. Mas devemos cobrar
que se inaugure um novo ciclo que aprofunde, enriqueça e inove para além
do que já foi incorporado pela população. Creio que o projeto do PT com
Dilma, não obstante os erros e as decaídas que aconteceram e que podem e
devem ser resgatadas, é ainda o mais adequado para o povo brasileiro.
Por isso apoio Dilma Rousseff.
Artigo originalmente publicado no portal Carta Maior
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